domingo, 8 de agosto de 2010

Lágrimas?

Não gosto de me demorar em caracterizações, mas vê-se um homem velho, de barba branca média, de passos leves, subir no ônibus, como de hábito, espera a sua vez de atravessar a roleta, como de hábito, o velho diz bom dia ao cobrador, como de hábito e atravessa a roleta, meio de lado , também como de hábito. Senta-se junto a janela, como nos dias de sorte, escora a cabeça no vidro e chora.

-Seria lágrimas tais dignas de um homem no auge da sapiência?
-Dignas? Só sei que são lágrimas... De perdão? De alívio? De sofrimento? De frustração? De desespero? De abandono? De alegria ou de tristeza? Não sei... Sei que são lágrimas...
-Não chores meu senhor.
-Mas esse é o destino das lágrimas, chorarem, por isso choro. Meus olhos se apertam e lágrimas rolam. São assim que elas funcionam, são lágrimas...
-Mas por que esse senhor chora?
-Não sei... Existe morte no percurso da vida, quando lágrimas são morte, quando lágrimas são medo de morte, não sei. Talvez excesso de vida também mata, talvez excesso de vida aumenta o medo da morte. Mas de tudo isso que digo, nada sei. Sei de minhas lágrimas que rolam...
-Essa vida é boa, meu senhor, acredite. Tenha fé, meu caro.
E o velho sentiu leve graça, pôs-se a olhar para a janela e ficou-se admirado com suas lágrimas no vidro intactas e encantado, com a ponta do dedo, pôs-se a desenhar um sorriso. Observou, apreciou, sorriu junto e desceu no ponto.

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